Ganho composto

Há sete anos no Brasil, compost barn se consolida ao promover conforto, saúde e bem-estar às vacas
O sucesso de uma nova tecnologia pode ser constatado quando ela é adotada e aprovada por um grande número de usuários, por se acessível do ponto de vista econômico e operacional, modernizando e aumentando a competividade, assegurando êxito nas operações. Segundo especialistas, o uso da tecnologia é o motor do crescimento econômico e social de muitas nações, sobretudo, quando permite controle e gerenciamento, dando oportunidade de otimizar processos, reduzir custos e potencializar a lucratividade. A tecnologia da informação, por exemplo, nos permitiu chegar a níveis extraordinários de conexão com o mundo, o que não seria possível sem a evolução dos sistemas operacionais dos computadores.
O compost barn, sistema de confinamento de rebanhos leiteiros que promove, dentre outros benefícios, conforto, saúde e bem-estar às vacas, se enquadra perfeitamente como tecnologia acessível que chegou no momento certo, no lugar certo e impulsionou a pecuária leiteira no Brasil. Teve um impacto enorme sobre as fazendas, de todos tamanhos. Permitiu às vacas, aumento de produção, com mais saúde e qualidade do leite, bem como possibilitou o crescimento do rebanho, tornando a atividade atrativa para diversas propriedades.
O sistema possibilitou aos pequenos produtores a ampliação dos investimentos, especialmente, assegurou os estudos dos filhos que, agora, se interessam pela sucessão na pecuária leiteira, pois veem que o negócio é bom, pode crescer e tem futuro.
Com o compost barn, as fazendas médias ganharam um novo fôlego, ao ampliar a escala de produção e a eficiência. Já as grandes propriedades, conseguiram aumentar a taxa de crescimento na atividade, pois pararam de ‘sucatear’ as vacas, permitindo, consequentemente, melhor remuneração aos acionistas.
O caminho
Do primeiro compost construído no Brasil, sete anos já se passaram e, sinceramente, quando eu e meu grande amigo Leonardo Dantas, que também é médico veterinário, convencemos os primeiros clientes a construir um compost barn, não tínhamos ideia do impacto que isso traria à pecuária de leite brasileira.
Naquele momento, procurávamos uma solução simples e barata para dar conforto às vacas, manter animais limpos, produzir mais leite e garantir uma reprodução melhor. O que nos inspirava era a busca por um sistema estável, onde as pessoas conseguissem executar as tarefas de maneira eficiente e com consistência, onde as vacas pudessem expressar seu potencial e se manterem saudáveis, gerando lucratividade ao produtor. O ponto de partida da nossa inquietude, foi constatar que dificilmente se conseguia gerenciar uma fazenda quando as primeiras chuvas levavam a um conjunto de situações caóticas, lama, problemas de casco, falta de sombra, mastite, vacas vazias e etc. A instabilidade dos sistemas existentes, demandavam tecnologias inovadoras, ainda que simples.
Ainda hoje, lembro-me perfeitamente das críticas e a da descrença de produtores e técnicos, quando propusemos o primeiro compost barn, a destacar: “vocês vão colocar as vacas em cima das próprias fezes? Em uma semana todas estarão com mastite”, diziam.
As primeiras experiências com compost, foram adaptações de pista de alimentação e outras estruturas disponíveis na fazenda. Como nosso conhecimento teórico era baseado na literatura americana, onde surgiu o modelo, na década de 80, e em breves conversas com técnicos israelenses, onde o sistema também era adotado, nosso desenvolvimento foi muito empírico.
As conquistas e os desafios
Atualmente, produtores, técnicos e colaboradores concordam que o compost barn assegura estabilidade, bem-estar, saúde, produção e permite que os processos sejam executados de maneira eficiente e homogênea. Contudo, o sistema não solucionou todos os problemas inerentes à atividade leiteira, aliás, isso nenhuma ferramenta irá solucionar. Essa solução passa, inevitavelmente, pela vontade diária de querer fazer melhor, planejar e gerir o negócio com eficiência.
O sistema
Normalmente, ao me abordarem na busca de um projeto e/ou consultoria, os questionamentos são bem similares: qual o custo e retorno? Qual o aumento da produção? Qual a melhora na qualidade do leite, saúde dos cascos, reprodução, consumo de cama e gasto energético?
Custos
Talvez um dos pontos mais discutidos entre os produtores e técnicos seja quanto custa para confinar uma vaca. Primeiro devemos comparar sistemas completos, com mesma área de cama, cocho e bebedouros, além de um sistema de ventilação sobre a cama, nos corredores de alimentação, sistema de climatização, sistema de coleta de dejetos e etc. Quando juntamos todas essas características de um sistema de confinamento de rebanho leiteiro, o valor aproximado é de R$ 4.500,00 por animal.
Produção
Quanto ao incremento da produção de leite média por vaca no compost a resposta é: depende. Se a fazenda conta com animais de alto potencial genético em ambiente muito degradado, o ganho será muito grande, chegando ao dobro da produção em dois anos no novo sistema. Contudo, também já acompanhei, em rebanhos muito bem manejados onde a média era alta, subir três a cinco litros. Presenciei ainda, propriedades onde as vacas tinha média de DEL (dias em lactação) muita alta, aumentaram pouco mais de um litro. Ou seja, ao construir um compost barn, o produtor não pode “perder a mão” da fazenda. É preciso atenção à reprodução, qualidade do leite e sanidade do rebanho.
Qualidade do leite
A melhora na qualidade do leite também foi expressiva na maioria das fazendas, especialmente, nas propriedades que adotavam sistemas semiconfinados, antes de aderir ao compost. Levantamento realizado em três propriedades com sistemas de pastejo e semiconfinamento, a média de CCS reduziu consideravelmente dois anos após a implantação do compost barn (quadro abaixo).
Observação: a média de CCS é anual e deve ser multiplicada por 10³ cel/ml
Já nos quadros de mastite, quando os agentes infecciosos envolvidos forem bactérias ambientais, o compost irá reduzir expressivamente a incidência da doença. Entretanto, isso não deve ser motivo para deixar de fazer linha de ordenha, cultura, tratamento e descarte de animais.
Locomoção
A melhoria do escore de locomoção das vacas é outro ponto muito destacado por produtores e colaboradores das fazendas que adotam o sistema. A maioria das lesões de casco nas propriedades brasileiras são mecânicas e infecciosas, exigindo práticas como a construção e manutenção eficiente de corredores, implantação de pedilúvio e casqueamento. Falhas nesses procedimentos, predispõem à afecções podais.
Reprodução
Ao retirar as vacas do sol e dar uma boa superfície para a locomoção, geralmente, há o incremento tanto na taxa de concepção, quanto na observação de cios, mas, basicamente, o que o compost faz é permitir que as vacas sejam resfriadas adequadamente. Resfriar vacas é o ponto onde as fazendas podem ganhar mais eficiência, melhora da taxa de concepção, da resposta imune e da eficiência alimentar. Basicamente, existem dois processos de resfriamento, o método direto com aspersores e ventiladores (gráfico 1) e o método indireto em um barracão fechado com placas evaporativas e exaustores (gráfico 2). Ambos os sistemas são eficientes.
Barracão aberto com aspersores e ventiladores
Oscilação da temperatura corporal de vacas quando submetidas ao resfriamento utilizando o método direto Gráfico Vacas com e sem resfriamento
Barracão fechado com túnel de vento
Oscilação da temperatura corporal de vacas em lactação e no pré-parto submetidas ao resfriamento indireto
Material da cama
Nos projetos e/ou consultorias que participo, indico dois a quatro metros cúbicos de material para cama/vaca/ano. Se o consumo for superior a esse, devemos checar área disponível por animal e evitar as entradas de chuva no barracão, o que pode deixar a cama molhada, não bastando o revolvimento e a intensificação do uso de ventiladores para sua secagem. Outro fator que afeta o consumo de material para cama é própria queima do carbono durante o processo de compostagem.
Em algumas instalações, especialmente nas regiões onde há escassez de material para cama, muitas vezes, as fazendas optam por fazer a própria maravalha. Apesar desse processo necessitar a compra do equipamento, esse custo tem se mostrado viável e uma boa alternativa, sobretudo nesses locais.
Uma cama de boa qualidade está intimamente ligada a quantidade de horas que as vacas permanecem deitadas.
Estresse térmico
Uma maneira fácil de constatar a gravidade do estresse térmico é comparar os indicadores do inverno com os do verão. Caso a comparação da média entre os dois períodos for superior à 5%, sinaliza um problema. Diversas fazendas que já confinaram as vacas em sistema de compost barn ou free stall tem uma diferença de produção próxima a 15%, o que quer dizer, por exemplo, que uma vaca que produz 34 litros de média no inverno, no verão cai a 29.
Futuro
As novas tendências da produção nos impõem focar em aspectos de sustentabilidade. Uso eficiente da água, manejo correto de dejetos e otimização de mão de obra, ocupam posição de destaque no pacote de investimentos para o futuro. No compost barn, os dejetos se transformam em importante fonte de nutrientes ao solo, solução que minimiza uma inquietante preocupação de caráter ambiental, comum em outros modelos de confinamento de rebanhos leiteiros.
Um passo à frente em matéria de
compost, é o galpão em túnel de vento, um modelo que exige mais técnica, porém, permite maiores ganhos em performance, estabilidade de produção e reprodução, além de menor custo energético. Em 2015 fizemos o primeiro
compost barn em túnel de vento no Brasil. Basicamente, este sistema usa placas evaporativas e exaustores para baixar a temperatura do ar e criar um ambiente com menor chance de estresse térmico. Atualmente, temos cerca de
20 barracões no modelo túnel de vento, alguns já em funcionamento, outros em construção.
ADRIANO SEDDON
Médico Veterinário fundador da Alcance Rural